22.7.08

140m^2

Achei que o matching seria perfeito, ou nada feito. Convenci que o comum desencontrado de um gostar do outro não era argumentário convincente. Que o berço tosco lacado a dourado poderia ser desculpa, que traçados de planetas em quadrados falavam, ressoando levemente, como teclas de portátil ou amigos imaginários, e diziam que não podia ser.

Mas ao fim do dia, quando o azul claro se gasta e pede licença para se ausentar, deixando no ar a recordação do calor, não é o quanto tonificámos a barriga ao som de asas de borboletas a amolgarem-se nas paredes do estômago, nem em piadas ditas de pé e ridas rebolando no chão, até à falta de ar, que importa:

É o quanto a sua casa nos soube a casa, ainda antes de a apalparmos com os pés, o quanto a nossa não cheira a nada que não estranho, falta de perfume caro com nota final de suor, na sua ausência.

8.10.07

1.3 MP

Sem flash. A mão a forçar o não tremor. O vento evacuado, e o mar obrigado a fingir-se dormir. Uma onda a meio do seu percurso, no ar, em posição estranha. Como se tivesse sido apanhada desprevenida a meio da noite, e achasse que parar na totalidade seria menos óbvio no seu fingimento que deixar-se deslizar até não existir.

Tu, um sorriso de olhos e boca séria. Brilho de um segundo na quantidade absurda de vários outros de boca aberta, em gritos e palavras de menos decibéis, socialmente também elas menos desejáveis. Os olhos brilhantes, não das várias lágrimas, mas de uma só felicidade, registada como prova a qualquer argumento, válida porque única remanescente.

Desprovido de movimento, continuidade ou contexto, o momento paira. Diz à memória que foi só imaginada. A tua mão, mais branca e brilhante - afinal com efeito do flash - move-se na quietude a que a realidade da foto e a actualidade dos factos obrigam. Chama-me para aquele lugar, onde todas as personagens, camadas extraídas de nós a cada expressão diferente do nosso rosto e a cada ruga de expressão que tentaremos eliminar mais tarde - sem sucesso - se esperam reunir ao que falta fragmentar.

Os óculos já não são oversized. Talvez sejam do tamanho perfeito, porque as lágrimas são também elas maiores. Em captar-te um bocado gastei mais um cartucho de flash que permitia alumiar-me. E em imortalizar-te, esteve a minha primeira forma de homicídio.

3.4.07

say cheese-y

Gostavas de estar porque não podes pegar no carro e acordar tarde de manhã, dormir agarrado só porque estão longe.

Ser fútil de romantismo de argumentista barato e estrela de cinema cara pela cara, só porque é tudo escrito e tudo arquivado e nada ressoa em contratos verbais negáveis até à morte.

Observar, só porque estão uns três prédios de arquitecto e um bairro social à frente e precisas de binóculos em vez dos olhos e uma diopteria e meia a separar-vos.

E tocar. Só que o digital de toque de dedos já não tem nada. O oral, quando não pornografia ou letra colada de outras tantas é muito pouco verdadeiro, e os sorrisos levam y no fim, de diminutos que são, feitos a sinais de pontuação a preto e sublinhados a amarelo para que os vejam. Apalhaçados, irónicos e a gargalhar com força em ouvidos com água imaginária a brotar, de mergulhos que nunca foram dados.

18.11.06

X marks the [dot?]

Talvez um dia, se o desalinho Studio Line dos planetas perder o prefixo, naquelas probabilidades que ficam atrás de trovoadas inteiras a caírem-nos em cima e sequências tão pouco possíveis de números. Quando as estrelas ganharem braços e lápis para se redesenharem a cumprir novas formas, mapas e figuras que só o nosso fechamento cognitivo, tão fértil , consegue ver, então aí vou acreditar que sim. Que o que me amas é comparável mesmo que de longe ao amor dos pintos pelas mães quando saem dos ovos, e que este não é fascinação genética pelo encarnado dos seus bicos. Que em certos momentos achas que o centro gravitacional da Terra muda e que isso arrasta obrigatoriamente as tuas lentes de contacto e os teus olhos a elas colados para mim.

Até lá, X não marcam lugares de coisa nenhuma, se o seu produto não tiver parcelas de onde vir a nascer, para no fim, e de qualquer forma, se apaixonar por novidades tingidas a encarnado.

26.3.06

Focus

Eram bancos de carro deitados e um estacionamento. O regresso aos 15 anos e aos pais na ignorância, em hormonas transversais a brancos antecipados. Festas em cabelo invejado, forças inocentes em mãos sabedoras a direccionar cabeças, com o peso e a necessidade de recolocação de um farol demasiado perto do mar.

Em magnetismos inversos às leis do maioritarismo, o toque. Áspero em macio, pêlo na sua inexistência, olhos abertos com olhos fechados.

No aliviar do cinto, algum tempo e bastante interesse na ondulação meio inesperada da cintura, meristema do mundo e buraco negro a engolir luz no mesmo momento.

Poupando-se a uns, frustrando-se outros na sua falta, a descrição, veio o resto. Com justificações e compatibilidades encontradas à pressa; sem lamechices imaginadas e presentes conhecidas pelas partes como desnecessárias a contratos mais simples, a continuação.

-Acaba tu se quiseres. Já me dói o braço.

13.2.06

lack of (L) and the same city




Este texto podia ser uma carta. Nada rescunhada porque a tecnologia consegue fingir que temos ideias elaboradas e coerentes que nos saem em frases difíceis de ler à primeira pelo comum mortal. Mas não teria quem pôr depois de "Dear", tão-pouco um endereço. Podia deixá-lo ao cuidado dos correios, e viria de volta, em jeito de onanismo sentimental, mas até para mim essa ideia seria auto-centrada demais.

Que comece.

O teu amor está perto do vómito. Igualmente sentido na barriga, e tão diferente. Parecidíssimo com a anteestreia de um exame, mas sem cronómetro que lhe aplique um fim. Perto da insuportabilidade, sustentável apenas porque não seria amor sem o ódio a hifenizá-lo, o contraste constante que permite à limitação cognitiva o reconhecimento de um conceito apenas na lembrança de outro que lhe seja diametralmente oposto.
Esbocei alguém, parcialmente plagiado daquilo que os produtores da Celine querem que ela grite, quando não sei desenhar nem escrever música que venda, e dei-lhe a tua cara. Vejo-te sorrir, quando só te vejo a má disposição. Quando não te vejo sequer.
E nesta alucinação de bruma de duche, nestas dormidas de sonhos fortes não sei de quê mas que me obrigam a dormir mais e a cansar mais ainda, como corações de chocolate que não foste tu a comprar, e mutilo-me na fome do estômago, para pensar menos na de ti.
Tum-tum.

t.

Note to self: enviar ao Pai-Natal. As inexistências podem sempre ser vizinhas.

27.1.06

"Eu sou do tamanho do que vejo, e não do tamanho de minha altura" (F. Pessoa, como A. Caeiro)

Às vezes, enquanto faço a barba - fazê-la, no sentido de lhe fazer exactamente o oposto -, mergulho a mão na água morna, a divorciar, não facilmente, pêlo de lâmina. O quanto tinha acordado perde-se um pouco, com a temperatura. Tento fazer caber nela o pulso, depois o braço até ao cotovelo... Imagino-me caber todo lá, fazer de lavatório piscina, perder-me na imensidão de uma pequenez e de uma irrelevância maiores que as que conheço, e boiar, junto com pedacinhos de espuma e restos de barba de três dias.

Quando amo - a.k.a. "canalizo carências para um alvo específico" - é o mesmo. De tornado complexado com os conceitos enjoados de brincadeira de outros sobre o quão discutível é o 1.66 do quadrado que está no B.I., desejo caber. Do mar, passo a querer banheiras, das banheiras passam a apetecer-me poças esburacadas em más estradas, e mesmo dessas poças às vezes só me satisfaço com gotas a meio sal, enquanto pingam do queixo antes de se perderem para o algodão da almofada.

Resta-me então passar a cara por água gelada, que não acaba nunca, a não ser que falhe a chuva ou feche a torneira, e acordar para a vida. E fazer o mundo caber-me no bolso.